O INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) registrou, em
2016, um rombo de pelo menos R$ 1,1 bilhão em aposentadorias e pensões pagas a
beneficiários mortos –o deficit previdenciário fechou 2016 em R$ 149,73
bilhões, pior patamar desde 1995. A informação consta de um relatório
elaborado por técnicos do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral
da União ao qual o UOL obteve acesso. O documento indica que o rombo pode ser
ainda maior e que há casos em que benefícios foram pagos em nome de pessoas
mortas em 2005.
A constatação dos gastos
irregulares surge em meio às tentativas do governo federal de aprovar no
Congresso Nacional sua proposta de Reforma da Previdência. Entre os principais
argumentos a favor das mudanças, está o deficit nas contas previdenciárias, que
estaria orçado em R$ 184 bilhões em 2017, segundo o próprio governo.
O governo começou, no segundo semestre do ano passado, uma
revisão nos benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
O relatório do Ministério da
Transparência explica a origem do rombo de R$ 1,1 bilhão no ano passado. Ela
pode ser dividida em duas partes.
A primeira é o pagamento
indevido a beneficiários mortos. Os beneficiários do INSS, na sua grande
maioria, recebem suas aposentadorias e pensões por meio de bancos cadastrados.
O dinheiro é depositado diretamente na conta dos titulares.
Quando um beneficiário morre, os
cartórios têm até o dia 10 do mês seguinte ao ocorrido para informar ao INSS
sobre o óbito. Pelas normas técnicas, após receber a informação, cabe ao órgão suspender
o envio do dinheiro ao morto.
O problema, segundo os técnicos,
é que nem sempre a suspensão dos benefícios acontece de forma automática. Eles
destacam que a demora para a suspensão dos benefícios é resultado de uma
conjunção de fatores que vai desde a falta de infraestrutura adequada para o
processamento das informações até a diminuição do quadro de pessoal do órgão.
Um levantamento feito entre
janeiro e agosto de 2016 detectou que o INSS pagou benefícios a 101.414 pessoas
que constavam como mortos no SISOBI (Sistema Informatizado de Óbito), operado
pela Secretaria de Previdência Social. Esse mesmo levantamento identificou
1.256 beneficiários cujas mortes tinham sido constatadas em 2005, mas que
recebiam benefícios em 2016.
Em média, segundo esse estudo, o
INSS levou quatro meses para suspender o benefício. O prejuízo apenas nesse
período dos oito primeiros meses de 2016 foi de R$ 460 milhões. Em
dezembro de 2016, o rombo totalizou R$ 1,134 bilhão.
A segunda parte da explicação
desse prejuízo é, segundo os técnicos, resultado da dificuldade do INSS em
reaver os valores depois que eles já foram depositados. Do R$ 1,134 bilhão
pago a mortos constatado em 2016, apenas R$ 119,1 milhões foram recuperados, em
torno de 10,4% do total.
Essa dificuldade, diz o
documento, decorre de uma série de fatores, como o entrave imposto pelos
bancos onde os beneficiários mortos mantinham suas contas para devolver os
recursos.
O relatório diz que os bancos
alegam, em muitos casos, que não podem simplesmente devolver os recursos por
conta do sigilo bancário.
Outro fator, diz o documento, é
a fragilidade dos controles internos no processo de cobrança administrativa,
evidenciada pela incapacidade da entidade de fornecer respostas aos auditores.
O relatório diz, por exemplo, que
o INSS não conseguiu nem sequer informar ao Ministério da Transparência a
quantidade de processos que o órgão já moveu para reaver recursos pagos
indevidamente a beneficiários mortos.
Além disso, os técnicos do
Ministério da Transparência constataram que “há progressiva perda da capacidade
de governança do INSS, que não dispõe de informações e meios para aprimorar a
prevenção às fraudes na concessão e manutenção de benefícios”.
Segundo o órgão, o INSS não tem
formas “efetivas de recuperar os valores pagos indevidamente”.
Erro inadmissível, diz auditor de ministério
Para o coordenador-geral de
auditoria da área de Previdência do Ministério da Transparência, Cristiano
Soares Pinto, o pagamento a beneficiários mortos é “inadmissível”. “Essa
questão dos mortos é inadmissível. Já colocamos no relatório, fizemos
recomendações e, na semana passada, oficiamos o INSS para ver que medidas eles
tomaram. Estamos aguardando o posicionamento deles”, afirmou.
Segundo o coordenador, o
dinheiro gasto pelo INSS em pagamentos a mortos poderia ser revertido ao
pagamento de beneficiários vivos. “Esse é um dinheiro que poderia estar no
Tesouro, sendo usado para pagar pensões e aposentadorias a quem realmente
precisa”, disse.
Outro lado
Procurada pela reportagem, a
Febraban (Federação Brasileira dos Bancos) enviou uma nota por meio de sua
assessoria de imprensa na qual informa que a entidade “e os bancos associados
pagadores de benefícios a aposentados têm apoiado o INSS na busca por soluções
que evitem o pagamento de benefícios daquele instituto a pessoas já falecidas”.
A reportagem também procurou o
INSS, mas não obteve resposta. Na última terça-feira (12), foi enviado um
e-mail com perguntas sobre o relatório com prazo de resposta para a
quinta-feira (14).
Na quarta-feira (13), o INSS
confirmou o recebimento do e-mail e disse que a demanda feita pela reportagem
estava sendo conduzida pela área técnica do órgão. Na sexta-feira (15), diante
da ausência de resposta, a reportagem enviou um novo e-mail cobrando resposta,
mas até a publicação desta reportagem, não houve retorno.
Fonte: UOL