Depois de tanta folia e alegria das multidões, o carnaval do século XXI ainda deixa cenas que propõem uma reflexão da distância que o homem se encontra da consciência ambiental, isso no mesmo mês em que o Brasil aparece no ranking do Fundo Mundial para a Natureza (WWF, sigla em inglês) como o 4º país no mundo que mais gera lixo plástico, atrás apenas de Estados Unidos, China e Índia.
E esses materiais que surgem nas ruas fazem do pós-carnaval um importante termômetro da gestão que o homem tem sobre o lixo que produz. Independentemente do local onde são jogados, nas capitais ou no interior, em baixas ou elevadas altitudes, é necessária uma corrida das prefeituras para que esses vilões não cheguem ao oceano. O problema é que das 11.355.220 milhões de toneladas de lixo plástico geradas por ano, apenas 1,2%, ou seja, 145.043 toneladas são recicladas.
Cada brasileiro produz 1 kg de lixo plástico por semana, segundo o estudo, e uma das cenas do pós-carnaval que mostram a relação despreocupada do homem com o lixo foi registrada na orla da Praia do Forte, ponto turístico de Cabo Frio, na Região dos Lagos do Rio.
Mas não precisa estar ao lado do mar para que o lixo plástico se torne um problema imensurável. Mesmo a 840 metros do nível do mar, o lixo plástico de Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio, é também uma grande ameaça. Um dos registros também mostra a situação preocupante do pós-carnaval na cidade.
Todo o lixo jogado em qualquer parte do mundo vai parar no oceano, como explica o pós-doutor em oceanologia e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Julio Waisserman.
"O lixo vai para os bueiros, segue pelos rios e desemboca no mar. Os microplásticos, por exemplo, podem levar até 200 anos para se decompor", afirma.
O especialista disse que se espantou com o que viu depois da folia.
"Não jogar lixo no chão é o mínimo de consciência que as pessoas devem ter. Fiquei muito espantado ao ver as ruas do Rio de Janeiro após a passagem de um bloco. Eram copos, canudos e sacos plásticos no chão. Isso é inadmissível", disse.
Para o especialista é preciso ser mais rigoroso com as punições diante dos graves riscos à saúde das pessoas e ao meio ambiente.
"A chuva carrega esse material para os bueiros e ele acaba na Baía de Guanabara, por exemplo. É por este motivo que vemos uma montanha de lixo ali", afirma.
As consequências dessa ação inconsciente podem ser observadas em pequenas ou grandes espécies aquáticas. Nesta segunda-feira (18), o G1mostrou o caso de uma baleia encontrada morta nas Filipinas com 40 quilos de plástico no estômago. O biólogo marinho, Darrell Blatchley, disse que ela morreu de fome e desidratação./i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2019/X/r/MaiV1EQTuguP9lXxxsHg/53402101-2689345561092015-59415611205222400-n.jpg)
Coleta no carnaval x destino
Em Cabo Frio, só durante o carnaval, a prefeitura recolheu 3 mil toneladas de lixo. De acordo com o município, essa quantidade inclui tanto os resíduos recolhidos nas ruas e orlas das praias quanto o residencial e hospitalar.
Já em Nova Friburgo, na Região Serrana, onde ocorre o segundo maior carnaval do Estado do Rio de Janeiro, foram recolhidos 120 caminhões de lixo nas ruas, segundo informou o município. A Secretaria de Serviços Públicos não soube informar em toneladas a quantidade de resíduos.
Nas ruas, os profissionais da área de limpeza encontraram garrafas pet e muitos copos e sacos plásticos.
Ainda segundo o órgão, não foi possível reciclar o lixo porque não houve a separação dos resíduos, por exemplo.
Rio e São Paulo
No Rio de Janeiro, onde ocorre o maior carnaval do país, foram recolhidas 1.227 toneladas de resíduos no sambódromo e nas ruas por onde passaram os blocos.
O número, segundo a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb), é equivalente ao peso de 205 elefantes e é 14% maior do que o que foi recolhido no mesmo período do ano passado.
A quantidade de resíduos potencialmente recicláveis, segundo a Comlurb, totalizou 8 toneladas. Este material será encaminhado para as cooperativas de catadores credenciadas na Companhia.
De acordo com o órgão, durante a festa, as equipes do Lixo Zero aplicaram 231 multas para descarte irregular de pequenos resíduos, no valor de R$ 205,60.
Já em São Paulo, foram recolhidas 916 toneladas de resíduos durante o evento, somando os desfiles de rua e Sambódromo do Anhembi.
Segundo o município, todos os detritos foram encaminhados às Centrais Mecanizadas de Triagem com o objetivo de reciclar o máximo possível.
De acordo com o secretário municipal das subprefeituras, Alexandre Modonezi, 50% do material foi reciclado e o valor obtido foi direcionado para as cooperativas de catadores cadastradas na Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb).
"Nos outros anos 100% do material foi para o aterro", lembrou Alexandre.
Nova metodologia em SP
Segundo a Prefeitura de São Paulo, houve uma mudança no procedimento de limpeza das vias, onde a varrição passou a recolher os resíduos secos para que pudessem ser reciclados.
Diferentemente das últimas edições do carnaval de rua, a prefeitura da cidade informou que o caminhão pipa passou pelas ruas apenas após a coleta de todos os resíduos, evitando assim que houvesse contaminação.
Outra medida, de acordo com o município, foi a implantação de mais de três mil papeleiras e 540 equipamentos, entre eles: contêineres, cestos aramados e pontos de entregas voluntárias.
As prefeituras do Rio, São Paulo, Cabo Frio e Nova Friburgo não souberam informar sobre a quantidade específica de lixo plástico que foi recolhida neste período.
Conscientização
Segundo Julio Waisserman, é preciso investir em políticas públicas para conscientizar cada vez mais a população.
Ele afirmou que já é comprovado que as pessoas adquirem educação ambiental nas escolas, ainda jovens.
Ele diz que existe uma dificuldade em conscientizar os adultos, mas que toda tentativa é válida, inclusive por meio de punições e multas. Veja como fazer sua parte para diminuir o lixo plástico.
Pesquisa WWF
A pesquisa da WWF também chama a atenção sobre os riscos desse tipo de resíduo para a saúde das pessoas. Desde 2000, a indústria de plásticos no mundo já produziu a mesma quantidade que em todos os anos anteriores somados.
O estudo também alerta para os perigos dos microplásticos, cujos impactos ainda não são totalmente conhecidos no campo econômico da poluição terrestre e os efeitos da ingestão pelos seres humanos e outras espécies. Para a WWF, é preciso que sejam feitas mais pesquisas para entender os riscos.
Porém, o estudo afirma que já se sabe que: "a poluição por microplásticos altera as condições do solo, o que pode impactar a saúde da fauna e aumentar a probabilidade de vazamentos de substâncias químicas nocivas no solo. Os resíduos plásticos também aceleram a degradação dos corais".
Quanto à ingestão de microplásticos pelos humanos, podem ser consumidos por meio de alimentos contaminados, como frutos do mar, principalmente mariscos, mexilhões e ostras. Além disso, estudo recente sobre água engarrafada constatou a contaminação por microplásticos em 93% das garrafas, provenientes de 11 marcas diferentes e em nove países.
Ainda segundo o estudo, equipamentos de pesca abandonados, perdidos ou descartados podem sufocar recifes frágeis, e as colônias microbianas que se formam nos resíduos plásticos podem resultar em maiores índices de doenças nos corais.
Fonte: g1.com