RIO — Três casos de demissões de professores de instituições públicas levaram aos holofotes o debate sobre o assédio sexual e os desvios na relação de poder entre docentes e estudantes. No ano passado, após uma série de denúncias e sindicâncias, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a de Goiás (UFG) afastaram membros do magistério que teriam forçado encontros com alunas e enviado mensagens eróticas pelo celular, conforme publicou o jornal “Folha de S.Paulo” no último domingo.
Em comum, as alunas admitem dificuldades em relatar os casos de assédio — acreditam que podem sofrer represálias, inclusive nas avaliações acadêmicas, e temem que as comissões montadas para averiguação sejam compostas por colegas dos denunciados.
A UFF demitiu, em abril de 2018, o professor de ciência política José Henrique Organista, que teria assediado 16 alunas no campus da universidade em Campos dos Goytacazes. Uma delas, que pediu ao GLOBO para não ser identificada, lembra que o professor a chamou para jantar pelo WhatsApp e chegou a pedi-la em casamento.
— Enquanto fui aluna dele, não o bloqueei porque era vice-representante de turma e me sentia na obrigação de manter esse canal aberto. Hoje vejo que era um equívoco. Procurada, a UFF afirmou que não há mais investigações sobre a conduta de Organista, já que ele “não faz mais parte do quadro de docentes”. Por meio de seu advogado, o professor negou à “Folha” que tenha cometido os abusos.
Em Goiás, dois demitidos
A UFG, por sua vez, lidou com dois casos em apenas um mês. Em junho, demitiu o professor de engenharia agronômica Américo José dos Santos Reis, após quatro denúncias de assédio. Logo depois, foi a vez de Rogério Elias Rabelo, que lecionava medicina veterinária, acusado de estuprar duas alunas.
De acordo com Ezequiel Morais, advogado de Reis, suas ex-alunas “criaram” motivos para retaliar o professor “em decorrência da não apresentação (...) de relatórios e de apresentação de trabalhos incompletos”. A defesa de Rabelo não foi localizada. A UFG ressaltou que não se manifestaria sobre os casos, “considerando os ritos no processo legal”, onde foi preservada a identidade das vítimas.
Membro da Associação Brasileira de Psiquiatria, Miriam Gorender avalia que casos de assédio decorrem de uma sensação de impunidade por parte dos professores denunciados.
— Não existe a possibilidade de vivermos uma relação totalmente simétrica. O professor deve ter o mínimo de autoridade para lecionar. A grande questão é até onde vai essa autoridade, e essa é uma linha muito tênue — adverte. — O ser humano não é especificamente bondoso. Precisamos estabelecer sempre mecanismos de controle.
Segundo o Ministério da Educação, a apuração e punição de casos como os de assédio sexual devem ser feitos pelas próprias instituições federais.
Veja depoimentos das vítimas
‘Falei que não admitiria aquilo, e ele começou a me retaliar’
"Era professora substituta com um contrato temporário de um ano, que poderia ser renovado para dois. Fui assediada já no primeiro mês de trabalho na UFF. Na época, ele não era o meu chefe, mas acabou ocupando essa posição. Começou a me dar muita atenção pelos corredores, puxar muito assunto. Até que um dia veio com uma conversa esquisita, perguntou sobre minha vida pessoal, e eu saí de perto.
Fonte: oglobo.oglobo.com
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